sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

São Silvestre – Impressões pessoais de um debutante

Por Wendell Andrade

Pra começo de conversa, é muito difícil escrever um texto sobre uma prova que terminou com a perda absurda de um conterrâneo e, acima de qualquer adjetivo, de um ser humano incentivador e verdadeiro exemplo no esporte. Mesmo assim, de algum modo, existe aqui ainda alguma força, até em nome da paixão pelo esporte, para se traçar algumas linhas sobre o que vi – e senti – durante essa 88ª edição da corrida de rua mais tradicional do País: a São Silvestre.

Disputar uma prova com quase 30.000 inscritos (sim, a Rede Gl*** está redondamente enganada quando diz 25.000, mas não havia menos do que 28.000 e meu número de peito prova isso!) é, sem dúvida, um evento pra jamais esquecer. Talvez aquele velho bordão que diz que “a primeira vez a gente nunca esquece” seja suficiente pra justificar. De qualquer forma, impressiona chegar num lugar e ver gente de todos os cantos do Brasil (e até de fora dele) na fila de retirada do kit. Mas talvez seja só “impressão de principiante”... Hoteis lotados e restaurantes especializados em massas lotados na noite do dia 30 também merecem ser citados.


Largada da São Silvestre 2012: quase 30.000 pessoas pelas ruas de São Paulo. “Engarrafamento humano” comprometeu qualquer possibilidade de “fazer tempo” na prova.

Depois de algumas perguntas como “por que diabos tu foste como foi participar da São Silvestre?”, ou simplesmente “o que é a São Silvestre?” que resolvi escrever alguns pontos que refletem minha opinião pessoal a respeito da última corrida do ano.

Apenas a título de esclarecimento: além de apaixonado por corridas, desde moleque assisto à São Silvestre pela TV (velhos tempos de Paul Tergat e Vanderlei Cordeiro de Lima!). Depois que comecei a correr, então, veio a questão, “porque não correr aquela prova que sempre assisti pela televisão?”. Bobagem? Pode até ser, mas o próprio prazer de correr, somado à tradição da prova e a toda essa “carga histórica” carregada por olhares atentos a uma tela todo santo final de ano te levam a propor a si esses desafios... Quem corre, deve entender.

Mencionei a palavra desafio e gostaria de frisá-la... Afinal, é em torno dessa palavra se centra minha opinião em relação à prova: quem se propõe a correr no último dia do ano achando que é uma prova “molezinha”, pode ter certeza, enganou-se completamente. Os 15,3 Km da São Silvestre exigem preparos físico e psicológico do atleta e não são nada fáceis. Quero dizer que se engana redondamente quem pensa se tratar de uma prova contemplativa ou “pra encerrar o ano com um ‘filé’”, porque o que temos neste cardápio é uma grande quantidade de pessoas, dispersas em vias muitas vezes estreitas demais e um sem-fim de subidas e descidas, muitas delas monstruosas, ou em quantidade suficiente para derrubar qualquer expectativa de “baixar tempo” ou pace. Esse é o aspecto do preparo físico que mencionei.

Já o psicológico, na verdade, é a confirmação de um ponto já levantado por muitos: pessoal, a São Silvestre não carrega consigo só o caráter de “corrida de rua”, mas também o de “festa”. Sim, de festa mesmo. Até me arriscaria a dizer que podia ganhar fácil o apelido de “o Carnaval dos Corredores de Rua”, porque é impressionante a quantidade e a diversidade de pessoas estranhas gente fantasiada e/ou descompromissada em correr se aventurando na prova. Não que eu não apoie (pra não ser ‘o chato da história’), mas aí está um ponto negativo da São Silvestre (volto a frisar, é minha opinião): se você está focado em correr, em dar o seu melhor numa prova, venha sabendo que, ou você deve a todo custo “cavar uma vaga” entre os primeiros lugares da largada (prepare-se para madrugar), ou deve fazer um esforço para não se aborrecer quando se ver rodeado de “carnavalescos” durante um bom tempo do percurso. Isso sem contar que as pessoas, por desinformação, desatenção – ou falta de educação mesmo – não dão a mínima respeitam as importantes faixas de pace situadas ao longo da largada, e que têm a função de colocar os mais rápidos para largarem na frente e os mais lentos para largarem atrás (nada mais justo, não?!?). O que se vê, na prática, é uma grande desordem, e adivinhe? Você acaba não conseguindo imprimir qualquer ritmo ou estratégia à prova! É gente que corre a 07:30 min/Km de pace na faixa de quem corre a 05:00 min/Km. Conclusão: eu e muitos não conseguiam correr! Particularmente, só encontrei o “meu ritmo” na altura do 6º para o 7º Km (veja bem, quase na metade da prova!), e ainda assim, com pequenos pelotões de “brincantes” pra desviar/ultrapassar, ziguezagueando a todo momento, o que frustra qualquer chance de tempo final satisfatório.

Outro ponto importante: São Silvestre não se enquadra naquele padrão de “corrida contemplativa”. Ambientes de beleza cênica que te tragam prazer ao longo da prova? Esqueça, não há nada demais pra contemplar. Se você é paulistano e está lendo esse texto, não tenho outra coisa a dizer senão “me desculpe”...

Enfim, o ponto mais “famoso” da prova: a Avenida Brigadeiro Luís Antônio, tão conhecida entre os corredores como a tal “subida da Brigadeiro”. Sim, é verdade, tem motivo pra ser considerada dura: além de ser o ‘cartão de visitas’ do 13º Km da prova, tem mais de 1 Km de extensão (pelo menos pareceu) e acontece depois que você já enfrentou 72634548730 várias subidas fortes na prova. Do meu ponto de vista, esse último ponto é indispensável, porque minha teoria é de que ela não é assustadora por si só: Seu “papel de vilã” é potencializado em razão de toda a circunstância da prova. A título de exemplo, quando a iniciei, meu pace saltou de 05:45 min/Km para 07:05 min/Km (!). Ou seja, é dureza mesmo, mas depende muito de como se vem enfrentando as dificuldades da prova. Reforça minha teoria o fato de que não foi raro ver gente quase “dando ré”, parando, ou abaixando-se com as mãos no joelho, naquela típica posição de cansaço extremo. Felizmente, não acompanhei os mais exaustos e consegui “vencê-la” sem parar. Quase 72h se passaram desde que concluí o percurso e ainda são fortes as dores na parte anterior da coxa, mais um indício da dificuldade que se constituem os aclives da prova...

Mas calma! Nem tudo são espinhos. A “Brigadeiro” tem uma grande recompensa e eu explico: uma vez vencida, ela desemboca na Avenida Paulista (final da prova!) e, meus amigos, essa reta final é uma entrada triunfal! Espectadores de um lado e de outro vibrando, musiquinha e seu orgulho de “vencedor da Brigadeiro” te arrepiam até a alma e fazem até com que você encontre forças para obter aquele sprint de chegada no final! Foi, sem dúvida, o melhor momento da prova! 1h27min40seg depois, foi agradecer a Deus e buscar a medalha, entregue há alguns metros dali, numa transversal do “coração financeiro do país”.


Eu (à esq.) e amigos paraenses que vieram fazer a prova. No grupo, fomos unânimes de que foi a corrida de rua mais difícil da qual já participamos.

Alguns pontos que merecem destaque, pré, durante e pós-prova:

Kit: fique com a resposta que achar melhor: Opção “a”: simplório; Opção “b”: nada demais, Opção “c”: já recebi melhores. Camisa, embora de malha razoável, não é nem de longe mais confortável do que os grandes circuitos com camisas patrocinadas por grandes fornecedoras de material esportivo (p. ex. a Adidas, na Meia Maratona Internacional do Rio de Janeiro);

Feira: a feira montada para os atletas antes da prova é muito variada e, mesmo tendo chegado no último dia, ainda encontrei um sem-fim de produtos para todos os gostos (e a bons preços). Todavia, pecaram pelo tamanho reduzido, que a transformou em um “formigueiro”, comprometendo o melhor proveito da iniciativa. De zero a dez, daria uma nota sete.

Disponibilização de resultados/fotos: lenta. Levamos mais de um dia para ter acesso ao resultado. E as fotos, até o final dessa redação, ainda não estavam disponíveis. Paciência...
Medalha: pesada e bonita. Recompensa à altura do desafio!

Nutrição: fraquinha. Muitos doces, alguns poucos cereais, e nada de frutas! Foram econômicos ou preferiram não arriscar demais... ao menos água havia bastante.

Entre pontos positivos e negativos, a São Silvestre mostra que é uma prova única, por todas as particularidades aqui citadas. Todavia, incluí-la em seu calendário pessoal de provas (ou não) é pura questão do quanto se está disposto a encarar no final do ano.

Se você quer desafio, é prato cheio. Se prefere “água-com-açúcar”, repense a possibilidade de passar o último dia do ano acumulando energia para o ano novo que virá.

E que venha o próximo desafio!

Israel, campeão, obrigado! Vá em paz com a certeza do dever cumprido entre nós!

Um comentário:

  1. amigo....lindo texto, de arrepiar. Faço de suas palavras as minhas. E ano que vem estarei lá novamente!!!

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